Sempre me disseram, que nos
últimos segundos de vida, toda ela desfila diante de seus olhos! Em todos os
meus anos como policial, mesmo nos momentos assustadores, isso nunca tinha me
acontecido, mas também antes, nunca estive prestes a morrer...
Lembrei-me de cada segundo, da
infância pobre, na Favela de São Luiz, de ver os meninos ricos, querendo ser
como eles, com seus brinquedos e roupas caras.
Veio minha entrada para a Polícia,
o desejo de fazer o bem, e o ódio de perceber que não importa o que você faça
nada nesse país nunca muda, e que os verdadeiros bandidos estão numa mesa pública!
Lembrei-me de cada detalhe, da
primeira mulher que beijei, do primeiro homem que matei, mas, não consegui me
lembrar quando parei de acreditar no que era certo ou errado. Eu já há muito
tempo não era um policial, pelo menos não de fato. Tinha farda e arma, me
chamavam de sargento, mas eu era só um lobo em pele de cordeiro.
Mas do que mais me lembro mais que tudo, foi daqueles olhos
verdes...
Quando ela entrou no boteco do Jair, parando tudo e todos,
com aqueles peitos fenomenais aquela bunda que nem cabia no shortinhos e com
aquela boca que pedia para ser beijada jamais imaginei que ela mudaria minha
vida para sempre!
O Boteco do Jair fica numa pequena esquina, logo no começo
do morro, sendo a garagem de uma antiga casa transformada em bar. A porta é de
metal que corre para cima, e a fachada é pintada com uma tinta vermelho acre. O
interior é revestido por azulejos antigos, em sua maioria branco, com alguns
faltando, pôsteres e bandeiras do flamengo decoram o lugar todo.
E ela veio chegando
serpenteando, pelas mesas de madeira com toalhas rubronegra, tudo naquele corpo
remetia a sexo, mas o olhar, os olhos verdes e exóticos naquele rosto cor de
chocolate eram enlouquecedores! Claro, que no morro tinha muita mulatinha de
olho azul, mas nunca gostei de lentes de contato, e aquelas duas poças de cobre
envelhecido eram naturais e hipnóticos.
- Como é que vai Sargento Moreno?
- Ela falou naquela sua voz rouca e sensual.
Eu a
desejei naquele momento!
- Melhor agora minha princesa! -
Puxei-a pela cintura, embora três de meus dedos já tocassem aquelas nádegas
perfeitas! Entre os seios siliconados um enorme colar todo em ouro, com um
gigantesco “D” cravejado de diamantes, meus olhos se fixavam naquela cena. As
duas coisas que eu mais amava ao alcance dos meus olhos. – Nunca te vi por aqui
minha boneca.
- Tenho uma proposta para você,
ela falou com aqueles lábios tão perto do meu pescoço me dando arrepios. Puxou
um celular dourado, e me deu.
Atendi ao telefone, um homem
falou, num estranho sotaque italiano, visivelmente caricato. Oferecia-me o controle
do morro em nome dele, era um grande e misterioso traficante, seu nome, somente
“Dom”.
-“Seja meu Capo, mio
bambino, e Io te farei molto Rico!”
– Era uma voz jovem percebi. – Seja fiel a mim e te farei molto rico
No inicio ri daquela situação surreal, mas aos poucos o Dom
se mostrou verdadeiro, os traficantes começaram chegar, dei cobertura a eles, e
assim, a coisa toda começou.
Fiquei rico! Mais do que podia imaginar, ouro e mulheres se
tornaram constante na minha vida, mas ela, a morena de olhos verdes, nunca
estava ao meu alcance. “Sou do Dom” ela dizia, “não do Capo!” Odiava aquilo, e odiava como aquela vadia parecia me
dominar! Seria luxuria? Ou seria amor? Nunca soube diferenciar um do outro...
As coisas continuavam bem, mas aquela mulher não saia da
minha cabeça, e era sempre através dela que eu falava com o Dom, nunca o via,
somente pelo telefone. Quando comecei a me tornar poderoso, ele me disse:
- Capo, você
precisa ser discreto, não pode chamar tanto a atenção belo! Precisa ser discreto capice?
Discreto e Fiel, só isso que te peço. Lembre-se, Bambino, Duas coisas derrubam um homem, dinheiro, e mulher.
Eu sorria, mas nunca gostei de descrição. Enquanto era
pobre, a descrição era uma obrigação, não tinha como não ser, mas agora, agora
eu podia ser o que quisesse. E eu amava duas coisas mais do que tudo: Dinheiro
e Mulher!
O Morro era minha vida, meu “reino particular” eu ganhava
um pouco de tudo, e assim ia levando a minha vidinha nada modesta ou discreta.
Até que teve aquela bendita festa, onde tudo mudou!
Festas, mulheres, drogas e bebidas eram comuns nas minhas
baladas particulares, mas, ela, nunca
ia.
Aquele dia foi diferente, ela chegou, cheia de graça e
beleza, e foi como se o mundo inteiro tivesse parado. O meu coração batia
segundo seu rebolado, e meus olhos estavam fixados naqueles dois olhos cor de
oliva. Linda como sempre, ela sorria. Parou a minha frente e começou a dançar,
o funk pareceu tocar novamente e ela ia até o chão, me levando as alturas.
- Oi
Morenão- Falou com aquela voz rouca e sensual que mais parecia um ronronado.
-
Falaí gatinha. Linda e tesuda como sempre ein?
Ela
riu gostoso, e me olhou com aquele olhar safado dela – Adoro quando você me
chama disso sabia?
Eu
sorri, e a puxei pra perto de mim, seus lábios quase nos meus. Ela colocou a
mão no meu peito, impedindo-me de beijá-la.
-
Não vai rolar capo, você sabe muito
bem, eu sou do Dom!
-
Porra guria você sempre diz isso, mas rebola e dança que nem uma vadia na minha
frente só pra me provocar!
Empurrei
a com força, ela quase caiu no chão, me olhou ofendida, mas não saiu de perto.
-
Ficou bravo é? Você devia dar graças a Deus, porque eu sempre deixo você tirar
uma casquinha. - Ela sorriu e colocou a
mão sobre os peitos, eu estava enlouquecendo já, de tesão e de ódio. Saquei
minha arma coloquei na cara dela
Para
de me provocar sua vadia ou vai conhecer o poder da minha vadia aqui! – Vadia é
o nome de uma das minha 9 milímetros.
Ela
pegou a arma com as duas mãos, me olhando firmemente nos olhos, abriu a boca, e
enfiou a arma na sua boca da maneira mais sexy e enlouquecedora que uma mulher
podia fazer!
Fiquei
absolutamente enlouquecido puxei ela com força, ela tentou me bloquear
novamente- Para capo já te falei! Eu
sou do dom!
-Hoje
mulher, eu sou teu dom! – E beijei-a
finalmente!
Não me lembro de chegar ao banheiro ou de tacá-la dentro da
banheira, mas me lembro de cada segundo dentro dela! Nunca nenhuma mulher droga
ou tiroteio me deu a sensação de profundo sublime que aquela mulher me deu!
Enlouquecido de desejo somente ouvia ela dizendo: Seja meu Dom, Capo, seja meu Dom!
Não havia mais morro, Dom,
Capo ou sargento, havia um cão dominado pela luxuria, nem percebi nos meses
seguintes quando o novo Secretário do governo, um tal de José Moraes assumira seu cargo, e nem mesmo,
que a polícia chegava cada vez mais perto. Fui exonerado, meus rendimentos
caiam, mas só me preocupava a minha Olhos Verdes que sumira!
Desde aquela noite ela desaparecera, procurei enlouquecido
por ela, mas fora como se ela nunca tivesse existido!
Fui despertado naquela manhã por um grupo de capangas. Um
chute nas costelas me fez despertar assustado, na minha frente um garoto novo
não mais de 20 anos. O Dom quer falar! Ele me entregou um telefone
Que caspita está
fazendo capo? – A fúria dele era
tanta que quase se esquecera de fingir seu sotaque. - Meus negócios estão
ficando cada vez menores, e você aí dormindo? Resolva a situação capo! Ou resolvo com você! Quero o
Secretário José Moares morto!
Fui trazido de volta a realidade e vi assombrado todo o
esquema daquele moleque tinha feito destruindo meu reino encantado, ouvi seu
discurso na internet sobre uma nova fase e o combate aos bandidos, minha foto,
e o meu nome na TV! Eu era agora o chefão e bandido, e aquela voz daquele
moleque, que me era estranhamente familiar, falando que ia me pegar e fazer
justiça!
Era a primeira vez em meses, que a minha boneca de olhos
verdes deixava de ser a única coisa em que pensava! O capanga do Dom já tinha
um plano: simularíamos um assalto, quando o tal secretário chegasse em casa, e
daríamos um fim, no desgraçado, na mulher e ainda tocaríamos fogo na casa! Um
recado bem dado de que o Dom não aceitava falhas!
Esse seria talvez o momento mais importante da minha vida,
tudo ali estava em jogo, e eu só pensava nela, sempre nela, na mulher que
mudara meu mundo e agora desaparecera. - Sou do Dom - ela dizia, teria ele
descoberto nosso caso? Estaria ela viva? E o que o Dom faria comigo se
soubesse? Eu não sabia dizer. Mas tinha que ganhar tempo, mataria o tal secretário
faria um serviço bem feito, botaria medo no povo do Rio, como nunca antes
fizeram, acharia minha amada, descobriria que era esse babaca de falso sotaque
italiano, meteria uma bala no meio da testa dele, me tornaria o novo Dom, e
ficaria com minha bela Dona de olhos verdes.
Paramos e ficamos de tocaia,
anos como policial me serviram bem, vi quando o moleque secretário saiu do
escritório. O carro, com a esposa esperando por ele, dei uma olhada com o
binóculo, talvez deixasse os rapazes se divertirem com ela antes de meter bala
no meio dos olhos dela.
Foquei no rosto dela, minha lentes infravermelhas
deixando-a com olhos de gato num mundo em escalas de cinza, e enlouqueci!
Lá estava ela, minha Dona, os olhos brilhavam sem sua luz
esverdeada, mas era ela!
Enlouquecido precisava dar um jeito em tudo, matar o cara,
e descobrir o que ela fazia com ele! Seguimos o carro, eu e os capangas do Dom,
todos com tocas, perfeitos assaltantes, as placas frias e tudo mais, somente a
minha moto era a minha! Sim queria que soubessem que tinha sido eu a matar o
Conselheiro.
Quando chegamos na entrada da casa, demos uma fechada no
carro, e descemos! Eu e meus capangas. Olhei nos olhos dela e vi o terror,
saquei a arma, e olhei na cara do desgraçado que tava infernizando minha vida e
comendo minha mulher!
E ele me olhou.
Não estava com medo, ao contrário, parecia esperar aquele
momento, seus olhos eram frios, e demonstravam um desprezo gelado. Coloquei o
dedo no gatilho, e falei. – Matem o Secretário, mas não firam a mulher.
O Primeiro disparo acertou no joelho, fazendo a rótula
explodir. O segundo e o terceiro foram no estômago, o quarto no ombro, o quinto
furou o pulmão, o sexto explodiu a mão da arma, e só então, é que começou a doer.
Cai no chão, meus nervos explodindo de dor, a surpresa era
tanta, que nem ouvi o que o Conselheiro gritou, mas os disparos pararam, na
minha frente minha própria mão decepada ainda tentava apertar o gatinho.
- Darei queixa mais tarde! Levem a moto! Me dêem essa
arma. Ele falou com forte sotaque
carioca, sua voz era tranqüila, os supostos assaltantes viraram as costas para
mim, e se afastaram. Somente o moleque que me acordara me olhou de relance, deu
um riso de escárnio e saiu, e então eu entendi:
Em nenhum momento, o Secretario Moraes fora alvo dos
assaltantes. Eu era o alvo, a execução era a minha.
- Por quê?! Perguntei perplexo.
Ele caminhou tranquilamente até mim, do seu lado, minha Dona
apareceu. Ele estendeu a mão a ela, que abraçou o braço dele, olhava para mim
com pena, as lágrimas surgiam nos meus olhos, meu coração doía mais que meu
corpo alvejado.
- Eu te avisei. – o sotaque carioca era marcante, chegava a ser
forçado, ele sorriu, - Adoro sotaques Bambino.
Ao falar no carregado sotaque Italiano meu mundo desabou de vez, percebi
porque a voz era tão familiar, era a única parte dele que eu conhecia.
- Eu te avise Beol, um Capo dever ser discreto, e fiel, te
avisei que só o dinheiro e as mulheres derrubam um homem... Você falhou Capo, e eu não admito falhas.
Ele se levantou, deu-me as costas, estendeu a arma. - Capo, Resolva isso!
Ela se aproximou pegou a arma, agachou-se na minha frente, parecia
levemente triste, apontou a arma para minha cabeça
-Foi tudo mentira? – Perguntei.
-Não - Ela disse.- Nem tudo...
-Eu te falei, que eu era do
Dom.
By Ti
Carvalho –
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